O buteco não fechou não!

Estou há mais de um mês sem postar nada no blog! Incrível como o tempo passa e a gente nem vê, de tanto que os compromissos do dia a dia tomam conta da gente. E tem outra coisa: com essa época de eleição, tudo o que eu tinha vontade de escrever era "metendo o pau" na falência da política brasileira, e isso não era exatamente o objetivo deste blog, então preferi me ausentar.

Bom, ainda não estou podendo postar nada de novo, até porque estou tentando concluir um trabalho de final de semestre (sim, final de semestre em outubro!) pro mestrado e não dá pra sair muito disso, então gostaria de recomendar a leitura do post "Entre parênteses" no blog da Tietta Pivatto, Bonito BirdWatching.

E aguarde pois em breve terei mais novidades "passarinhísticas" ;-)

Ah, e antes que eu me esqueça: o assunto do "estupro" ao Parque Nacional da Serra da Canastra não está esquecido! Espero ter mais novidades em breve...

Mais sobre o recorte da Serra da Canastra

Engraçado como algumas questões são capazes de mobilizar forças e ideologias teórica ou historicamente opostas em prol de um mesmo objetivo. Não que isso seja algo condenável em si, já que a complexidade do ser humano torna isso mais que natural.
O problema é quando essas forças se unem motivadas por interesses particulares (lícitos ou não, claros ou obscuros) ou corporativistas. Mostra recente disso que estou falando é a atuação do deputado federal Aldo Rebelo na luta pela aprovação de uma nova proposta para o Código Florestal. Membro do Partico Comunista do Brasil (PCdoB), Aldo Rebelo se tornou o "queridinho" da bancada ruralista, em geral composta pela direita conservadora e representante dos latifúndios monocultores e do agronegócio em geral, ao propor relatório desfigurando o Código Florestal brasileiro. Nem mesmo a bancada ruralista esperava tamanho empenho do nobre colega "comunista" na defesa dos interesses dos grandes proprietários de terras e burgueses do agronegócio.

Também tal convergência de interesses está presente no caso dos projetos de lei que propõem a redução da área do Parque Nacional da Serra da Canastra. Os projetos, apresentados em 2007, foram assinados pelos deputados Carlos Melles (DEM), Odair Cunha (PT), Maria do Carmo Lara (PT, atual prefeita de Betim), Geraldo Thadeu (PPS) e Rafael Guerra (PSDB). Novamente, vemos a atuação conjunta de legendas normalmente divergentes (PT, PPS, PSDB, DEM) com o objetivo comum de permitir que a roda do capitalismo desenfreada passe por cima da conservação da biodiversidade. Ou, talvez, o objetivo de cada um desses políticos citados nem esteja tão assim no plano ideológico. Talvez seus interesses sejam mais mundanos. Podemos refletir sobre isso olhando alguns dados:

O deputado Carlos Melles, principal autor dos projetos de lei 1448/2007 e 1517/2007, é um dos mais poderesos deputados mineiros, tendo sido até mesmo cotado para ser candidato à vice-presidência ao lado de José Serra nas eleições deste ano. Grande cafeicultor, foi dono da terceira campanha mais cara entre os deputados de MG em 2006. Seu nome consta em alguns escândalos e suspeitas de corrupção do cenário político brasileiro, sobre os quais não vou me alongar aqui. Para saber mais sobre o que já saiu na imprensa sobre o deputado, veja essa página da Transparência Brasil.

Ainda segundo o site da Transparência Brasil, os doadores da campanha do deputado Carlos Melles em 2006 incluem empresas do setor de siderurgia, construção civil, e entidades ligadas à cana-de-açúcar e à cafeicultura. Essas doações somaram cerca de 1,22 milhões de reais.

Outro fato notável - e BEM notável - é que o deputado e alguns familiares adquiriram, em 2008 (após a apresentação dos dois projetos de lei), a "Fazenda Boa Vista" no município de Delfinópolis. Com 254 ha, a fazenda foi adquirida por R$ 787 / ha, preço bem desvalorizado devido ao fato da fazenda estar dentro do Parque Nacional da Serra da Canastra! Com a aprovação dos seus próprios projetos de lei, a área de sua fazenda passaria a se localizar fora do Parque Nacional e a cotação da terra passaria para algo em torno de R$ 10 mil / ha. Um investimento mais rentável que qualquer bolsa de valores do mundo, não é mesmo?! Ah, para saber de onde tirei essas informações, basta clicar aqui.

Interessante também é a lista de doadores da campanha de 2006 do deputado Odair Cunha. Nela, constam novamente os cafeicultores e empresários do agronegócio, o que não é surpresa. Interessante é que está, também entre os doadores, o setor da MINERAÇÃO, aquele com maior interesse na exploração de recursos embaixo das áreas hoje pertencentes ao Parque Nacional da Serra da Canastra.

Mais uma vez, fica evidente que precisamos pensar bem a respeito de a quem estamos concedendo o poder de nos representar politicamente. Precisamos ficar atentos aos interesses que guiam as escolhas e decisões que essas pessoas tomam. Será que estão realmente representando os interesses coletivos do país, ou estão apenas legislando em causa própria ou por seus setores? Que tipo de "retorno" esses políticos dão aos doadores de suas campanhas?

Pense nisso. Pelo bem do Brasil e pelo bem de nossa biodiversidade. Pesquisei bastante para escrever esse post e digo, sinceramente, que não escrevo mais sobre os fatos acima expostos, e também sobre outros, por simples nojo de tudo que encontrei. Infelizmente...

Serra da Canastra: a paisagem que você quer e a que eles querem


Você trocaria esta paisagem:



por esta?




E que tal trocar esta imagem:



por esta?




Saiba que a sua escolha está nas mãos, agora, do Senado Federal, que irá avaliar dois projetos de lei que irão permitir a transformação de parte do Parque Nacional da Serra da Canastra em áreas de mineração como essas acima.

Clique aqui e saiba mais sobre esses dois projetos de lei

Créditos das fotos:
1) Cachoeira Casca d'Anta (Serra da Canastra) - Autor do blog
2) Mina Ekati, no Canadá - http://goo.gl/cWQy
3) Família de pato-mergulhão (Mergus octosetaceus) - Sávio Freire Bruno
4) Caminhões de mineração - http://goo.gl/wO69

Facebook, gaiolas e os prazeres do birdwatching

Essa semana fiz um perfil no Facebook. Nem sei bem por que, pois não tenho muita paciência com as redes sociais e já tenho um perfil no Orkut que raramente uso. Acho que depois que entrei no Twitter e vi que tinha coisas bastante legais e úteis sendo compartilhadas por lá, resolvi experimentar o Facebook pra ver do que se tratava.
Ainda não aprendi todas as manhas da ferramenta, mas uma coisa muito legal que descobri no perfil da Tietta Pivatto foi um aplicativo dentro do Facebook onde dá pra ir registrando nossa lista pessoal de aves, ou seja, a lista das aves que já observamos na natureza. Isso foi ótimo pra mim, pois agora tenho um lugar só pra deixar registradas as aves que vejo por aí. Antes, eu deixava tudo espalhado em planilhas organizadas por local de observação, e juntar tudo numa lista pessoal demandaria um tempo considerável que a gente nunca encontra. Além disso, às vezes a gente vê alguma ave nova por aí e nem sequer registra formalmente numa planilha e o registro acaba se perdendo... foi o caso, recentemente, com o gaviãozinho (Gampsonyx swainsonii) que apareceu aqui na porta de casa dia desses.

Bom, o interessante disso tudo é que eu "descobri" que já observei, livres na natureza, mais de 170 espécies de aves! Nada comparável com as mil oitocentas e tantas espécies existentes no Brasil, e muito pouco também comparado com as centenas de aves que outros observadores mais experientes já viram em suas andanças.

Entretanto, saber a quantidade de aves que já observei na natureza foi interessante ontem quando vi dois periquitinhos exóticos que vivem numa gaiola de um vizinho. Qual seria a vantagem, pelo menos para mim, de manter dois passarinhos presos numa gaiola se eu posso ver muito mais na natureza? O dono daquela gaiola tem ali, no máximo, duas espécies de aves, e vai ficar sempre restrito a observar aquelas duas espécies, seus cantos e comportamentos.

Eu, por outro lado, já vi mais de 170 espécies até hoje, ouvi outros tantos cantos e vocalizações diferentes, conheci várias pessoas e um monte de lugares super legais como parte do processo de "ver passarinhos". E tenho muito, muito mais pra ver e conhecer!
Assim, me parece que não são só os pássaros engaiolados que ficam limitados em sua vivência. Também o ficam os "donos" desses animais, que optam por restringir suas possibilidades diante de uma biodiversidade incrível que temos no nosso país e que fascina observadores de aves estrangeiros que vêm aqui só para ver o que nós podemos ver todos os dias pelas janelas de casa...

Nada contra os criadores de aves legalizados, mas quero apenas propor essa reflexão sobre o quanto nós podemos ganhar optando por desfrutar o prazer de conviver com a natureza de maneira genuína. Desfrutar a natureza não é ir para a beira do rio fazer churrasco e tomar cerveja ouvindo o "pancadão" do som do carro, deixando para trás o lixo produzido. Desfrutar a natureza é se integrar a ela de verdade, observando como ela funciona, como nós funcionamos e somos parte dela. Observar e estudar passarinhos (e outros bichos) livres na natureza, como muitas pessoas fazem, é UM dos caminhos para essa integração. Um caminho divertido, saudável, e muito, muito rico!


Meu cunhado e eu observando aves no Parque Estadual Intervales, interior de SP, um dos inúmeros lugares  fantásticos para se observar aves e conviver de verdade com a natureza no nosso país.

Visitantes desta última semana

Os suiriris (Tyrannus melancholicus), que estavam meio sumidos há pelo menos uns dois meses, estão começando a voltar. Creio que tenham migrado por uns tempos para algum lugar com mais oferta de alimentos (insetos). De umas duas semanas pra cá tenho visto um ou outro suiriri pelos fios da cidade, mas ainda não vocalizando com a frequência que vemos durante a época reprodutiva.


Suiriri (Tyrannus melancholicus), espécie que está começando a voltar novamente à área urbana de Uberlândia depois de uns tempos fugindo da diminuição temporária de recursos no inverno. Foto: WikiMedia Commons


Quem também deve começar a chegar agora em meados e final de agosto aqui por Uberlândia são as tesourinhas (Tyrannus savana), que voltam de suas temporadas na Amazônia para nos brindar com a visão de suas grandes caudas em forma de tesoura, que exibem por aqui durante a estação reprodutiva.


Tesourinha (Tyrannus savana), cujos bandos começam a chegar em meados de agosto à região do Triângulo Mineiro. Foto: WikiMedia Commons

E pra finalizar o post: estou me mudando de casa. Estou indo morar num apartamento onde, creio eu, terei mais espaço para ver as aves pelas sacadas e até mesmo colocar alguns bebedouros para beija-flores. E quem esteve aqui para se despedir agora há pouco foi uma coruja-buraqueira (Athene cunicularia), que pousou no fio em frente à janela de casa e me presenteou com uma novidade: o canto da coruja-buraqueira. Nada demais no canto dela, a não ser o fato de que eu não o conhecia rsrs. Eu só conhecia a sua vocalização de alerta, os gritos que ela dá geralmente quando as vemos por aí nos terrenos baldios.

Outra ave que "deu as caras" aqui em frente essa semana foi o gaviãozinho (Gampsonyx swainsonii), essa sim totalmente nova para mim, apesar de ser uma espécie comum na cidade. Creio que sua presença se deva à proximidade daqui de casa com o Rio Uberabinha.

Agora vou dormir porque quero acordar amanhã cedo e tentar passarinhar um pouco aqui por perto! =)

Mocho-diabo no Parque do Sabiá

Post rápido, só pra mostrar a interessante coruja que tive o prazer de conhecer pessoalmente hoje. Fui ao Parque do Sabiá com minha namorada Larissa para acompanhá-la em um trabalho acadêmico de fotografia e ao voltarmos no fim da tarde fomos surpreendidos por uma coruja grande que voou a alguns metros à nossa frente, partindo em vôo baixo até uma árvore a uns 100m. Como era grande demais para ser uma coruja-buraqueira (Athene cunicularia), resolvemos ir atrás dela para descobrir do que se tratava. A responsável por achar a coruja foi a Larissa, que me chamou dizendo que era uma coruja "orelhuda". Depois de ver o bicho por uns instantes, peguei a câmera e fui tentar tirar uma foto para identificá-la depois em casa... O resultado está aí: uma mocho-diabo (Asio stygius), olhando desconfiada pros curiosos humanos que a observavam :-)

Mocho-diabo (Asio stygius) que vimos hoje no Parque do Sabiá (Uberlândia, MG). Precisei dar um zoom na foto original pois minha câmera tem só 4x de zoom ótico... mas dá pra ver ela direitinho. A foto original está postada no WikiAves.

Serra da Canastra e pato-mergulhão por um fio

Meu caro leitor, você conhece a Serra da Canastra? Já teve a oportunidade de visitá-la? Sabe quais as fitofisionomias lá presentes? As espécies endêmicas do parque? As espécies ameaçadas de extinção que ela abriga? As espécies de aves migratórias que dela dependem para sua reprodução e sobrevivência? E sabe da importância daquela região (e do Cerrado em geral) para o abastecimento de água do nosso país?


Cachoeira Casca d'Anta, no Parque Nacional da Serra da Canastra.


Não obstante tudo isso, a preservação da Serra da Canastra está por um fio. Dois projetos de lei (PL-1448/2007 e PL-1517/2007) recentemente aprovados pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados propõem a transformação de parte do Parque Nacional da Serra da Canastra em Área de Proteção Ambiental (APA). A APA é uma categoria de unidade de conservação que, ao contrário do Parque Nacional, permite sua exploração "sustentável".

"Mas por que isso?", você pode me perguntar. A resposta dos "ilustres" deputados responsáveis por esse verdadeiro atentado ao meio-ambiente é a de que estariam, assim, regularizando a situação fundiária das cerca de 2 mil pessoas que vivem na área não-demarcada do Parque.

"Mas isso é muito bom!", você poderia me dizer. Sim, seria ótimo resolver a situação daquelas pessoas de maneira que elas pudessem seguir suas vidas de maneira sustentável e sem afetar o equilíbrio ecológico de uma das mais importantes unidades de conservação do Cerrado brasileiro. 

Para os menos ingênuos, porém, a verdade é bem mais suja (como costumam ser as fichas criminais dos nossos nobres políticos): o verdadeiro interesse daqueles que querem recortar a Serra da Canastra é liberar o local para a exploração mineral.

Ao longo dos anos, o Departamento Nacional de Produção Mineral concedeu inúmeras licenças para prospecção e exploração de diamante e quartzito dentro da área do Parque Nacional da Serra da Canastra. Uma verdadeira ilegalidade, um estupro ao que reza o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).
Essas licenças foram concedidas, em sua maioria, à empresa Samsul Mineração Ltda. e suas subsidiárias. Transcrevendo do próprio site da empresa: "A Samsul Mineração Ltda. é uma empresa Brasileira, 100% controlada pela empresa Canadense Brazilian Diamonds Ltd., com ações nas bolsas de Vancouver e Londres [...]"

Ora, meu amigo, veja bem... alguns dos nossos representantes no Poder Legislativo estão, portanto,  querendo entregar um dos mais importantes Parques Nacionais do nosso País para as mãos de "meia-dúzia" de acionistas estrangeiros para que eles ganhem dinheiro às custas da total degradação do nosso meio-ambiente. E que não me venham dizer que quem ganha com essa atividade econômica é a população local, porque essa população não vai ser mais do que massa de mão-de-obra barata para as mineradoras. E essas, por sua vez, não darão às pessoas mais do que míseros salários travestidos de "bênção" e um legado de poluição e desastre ambiental. A população local ganharia muito mais se pudesse exercer atividades sustentáveis como, por exemplo, o turismo rural e o ecoturismo responsáveis. Essas alternativas seriam muito mais vantajosas em termos de distribuição de renda para a população da região do que a concentração da extração mineral nas mãos de uma grande empresa estrangeira.

Mas por que eu estou falando disso tudo num blog de aves? Simplesmente porque as áreas onde se encontram as jazidas de diamante que os "nobres" deputados querem conceder às mineradoras estão sobre territórios de uma das espécies de aves mais ameaçadas do mundo: o pato-mergulhão (Mergus octosetaceus).

Estima-se que existam na natureza (em todo o planeta) cerca de 250 indivíduos dessa espécie. Sim, apenas 250. A maior parte deles na Serra da Canastra. E sabe do que o pato-mergulhão precisa para sobreviver? Água limpa e mata ciliar. E sabe onde ficam as minas de diamante? Na beira dos rios e córregos. Não por acaso, a figura abaixo mostra exatamente uma dessas minas (instalada dentro do Parque Nacional - diga-se de passagem) localizada no Córrego Cachoeira onde - adivinhe só - existe o pato-mergulhão! Ou pelo menos existia em 2006 quando foi realizado o maior censo dessa espécie naquela região...

Mina de diamante na área do Parque Nacional da Serra da Canastra. Imagem extraída da Rem: Revista Escola de Minas

Se você acredita em fada-madrinha, papai-noel, coelhinho da páscoa e afins, não precisa fazer muita coisa senão aceitar as justificativas esfarrapadas que os deputados inventaram para embasar esses projetos. Agora, se você tem um mínimo de consciência crítica, deve pensar por você mesmo a partir de todo o valor científico, histórico e ambiental presentes na região da Serra da Canastra. E, ainda, pode entrar em contato com o deputado em que votou nas últimas eleições e solicitar que ele peça a revisão em Plenário desses dois projetos de lei. Caso seu deputado não te atenda, o mais provável é que ele esteja mais interessado nos "incentivos" oferecidos pelas mineradoras do que no seu voto e, portanto, nas próximas eleições você já saberá em quem NÃO votar, não é mesmo?!

Por fim, seria injusto não mencionar os autores dos dois projetos de lei e também os dois únicos integrantes da CCJC que votaram contra as duas propostas:

Autores dos PLs 1448/2007 e 1517/2007: Deputados Carlos Melles, Odair Cunha, Maria do Carmo Lara, Geraldo Thadeu, e Rafael Guerra.
Votaram contra: Sarney Filho e Regis de Oliveira.